quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Os vestígios nazistas em Natal: Lendas urbanas ou fatos históricos?


Taís Cruz


Quem foi meu aluno na disciplina de Ensino de História, já deve ter ouvido falar sobre uma casa antiga no bairro da Ribeira. A casa poderia ser como todas as outras do conhecido bairro. Entretanto, um fato muito interessante faz com que ela seja destacada das demais: um piso com símbolos da suástica nazista.





Em 2005, estava fazendo uma pesquisa sobre o bairro da Ribeira. Uma pesquisa solicitada pela prefeitura do Natal, organizada pelo departamento de Políticas Públicas da UFRN. Ao me deparar com um comerciante local, perguntei sobre um casarão, situado na antiga “rua das virgens”. A resposta não podia ser mais curiosa. De acordo com o comerciante, senhor que aparentava ter uns 55 anos, a casa pertenceu ao alfaiate Guglielmo Lettieri. Responsável por trazer a primeira fábrica de gelo para Natal.


Até aí, nada demais! Apenas um senhor que veio da Itália trabalhar no Brasil. Porém, em um dado momento da entrevista, ele afirmou que Lettieri era um espião nazista. Ele teria trabalhado com os italianos e alemães para repassar informações ao Eixo, no período da segunda guerra mundial. Mas teria sido preso em 1942, quando o Brasil entrou na guerra com os Aliados.


Essa “lenda urbana” já é conhecida em Natal. Principalmente, porque já foi contada por historiadores renomados da capital. O historiador Leonardo Barata foi um deles. Contudo, a evidência maior seria um assoalho na sala do casarão, com a suástica nazista. Sim! Ela existe. Veja a foto abaixo. 






A lenda e os fatos históricos despertaram minha curiosidade antropológica. Sendo assim, resolvi investigar a história por conta própria. Mas confesso que não cheguei ainda a exaustão de uma pesquisa acadêmica. Todavia, algumas coisas podem ser levadas em consideração neste texto: Em primeiro lugar, é fato a existência do senhor Guglielmo Lettieri. Inclusive, alguns membros de sua família moram em Natal (cheguei a conversar com um). Em segundo lugar, existem registros sobre as atividades que ele exercia no bairro da Ribeira. E em terceiro, cheguei a conversar com um senhor que falou ter sido amigo de Guglielmo.


Quando conversei com este senhor (não recordo o nome), ele chegou a defender Lettieri. Alegando que houve um mal-entendido, por razões da relação comercial de Guglielmo com os alemães.Um dos seus familiares também alega inocência.


Diante do depoimento destes senhores, podemos nos perguntar: Por que alguém colocaria em sua sala, vários ladrilhos com a suástica de Hitler? Principalmente em tempos de "guerra fria"? 





Em 2012, voltei ao casarão e tirei novas fotos do piso. Ao chegar em casa, fiz uma pesquisa na internet e, percebi que o lado da suástica encontrada no chão do casarão não é igual ao que os nazistas usavam. A diferença é sutil: uma gira para o lado direito e a outra para o lado esquerdo. Teria sido apenas um erro do pedreiro? Ou o símbolo seria na verdade o mesmo usado pelos budistas? Acredito que nunca saberemos.


Apesar da importância histórica do casarão e dos fatos relatados, poucos acadêmicos tiveram interesse em investigar essa história. Muitas pessoas que viveram nesta época estão falecendo. A memória não está sendo preservada. E o casarão passou ao domínio privado. Diminuindo ainda mais as chances de uma pesquisa arqueológica. Isso mesmo! Sendo Guglielmo um espião nazista, o local poderia ter até túneis secretos, ou artefatos escondidos. 


Essa teoria não pode e não deve ser descartada. O Brasil possuía, em meados de 1930, uma singular relação comercial e política com a Alemanha. Natal chegou a receber um presente importante do ditador italiano Benito Mussolini. Inclusive, nosso alfaiate Guglielmo “foi durante algum tempo representante oficial do governo italiano em Natal. Foi ele que recebeu e apoiou os aviadores italianos Arturo Ferrarin e Carlo Del Prete. Estes dois homens realizaram o primeiro voo sem escalas entre a Europa e a América do Sul e pousaram na bela Praia de Touros, a cerca de 80 quilômetros ao norte de Natal. Na nossa capital foram recebidos e festejados pela comunidade italiana.”


Era, Guglielmo Lettieri, um espião nazista? Ou apenas: um italiano certo, na hora errada?! Vamos dormir com essa dúvida!




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